Juiz Jean Bezerra destaca combate à lavagem de dinheiro como estratégia central contra o narcotráfic

Juiz Jean Bezerra destaca combate à lavagem de dinheiro como estratégia central contra o narcotráfic

Nesta segunda-feira (7 de julho), o juiz Jean Garcia de Freitas Bezerra, titular da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, ministrou aula com o tema “O enfrentamento à lavagem de dinheiro como forma de aplacar a narcotraficância”, dentro da programação do curso promovido pela Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso (Esmagis-MT), voltado ao aprofundamento da Lei Federal n. 11.343/2006. Essa foi a 10ª aula do curso “Lei de Drogas – Aspectos Jurídicos, Político-Criminal e Prático”.

Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFCE) e pós-graduado em Administração Judiciária pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o magistrado é membro do Grupo de Estudos da Magistratura (Gemam) e da Comissão Especial sobre Drogas Ilícitas do Tribunal de Justiça de Mato Grosso.

Durante a exposição, o juiz destacou que a criminalidade organizada representa uma das maiores ameaças à segurança pública e às instituições democráticas. No centro dessa estrutura está a lavagem de dinheiro, mecanismo que transforma os lucros do tráfico em poder econômico. “Através da lavagem, os criminosos se reinserem na economia formal e informal, retroalimentando e financiando suas atividades ilícitas. O enfrentamento à lavagem é uma estratégia extremamente eficaz no combate à criminalidade e à narcotraficância”, afirmou.

O magistrado alertou para a crescente sofisticação das facções criminosas, que já operam inclusive com a criação de bancos digitais não autorizados. Segundo dados apresentados na aula, estima-se que apenas a cocaína que transita pelo Brasil sem ser apreendida movimenta cerca de US$ 65,7 bilhões por ano, o que corresponde a aproximadamente R$ 335 bilhões — valor equivalente a quase 4% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional em 2021. O montante é três vezes superior ao total investido por União, Estados e municípios em segurança pública no mesmo período.

Ainda conforme o estudo citado, o faturamento anual do Primeiro Comando da Capital (PCC) é estimado em R$ 6,7 bilhões, evidenciando a transformação do tráfico em um modelo de negócios altamente estruturado.

O juiz Jean Bezerra explicou as origens da lavagem de dinheiro, as gerações das leis que tratam do tema (1ª, 2ª e 3ª) e suas três fases: colocação, dissimulação e integração. Ressaltou que a lavagem de capitais é um crime autônomo, mas que depende da existência de um crime antecedente. No entanto, nem toda ação posterior ao crime-base configura lavagem. “O simples usufruto, guarda ou transporte do produto do crime não é suficiente para caracterizar o delito de lavagem”, pontuou.

Entre os pontos apresentados com base em jurisprudência, o magistrado destacou que não se exige sofisticação nos atos de mascaramento, tampouco que os bens percorram todas as fases da lavagem. Apontou ainda os principais sinais de alerta (red flags), como: pagamentos em dinheiro vivo para aquisição de bens de alto valor; incompatibilidade entre renda declarada e patrimônio; transferências rápidas de propriedade; uso de interpostas pessoas sem justificativa; ausência de comprovação da origem dos recursos; e empresas de fachada como compradoras.

O juiz também abordou casos concretos e jurisprudências envolvendo o uso de “laranjas”, testas de ferro, cessão de contas bancárias e a utilização de offshores — empresas constituídas em paraísos fiscais com baixa tributação, sigilo bancário rigoroso e pouco controle ou exigências regulatórias.

Para o magistrado, o combate à lavagem de dinheiro deve ir além das medidas cautelares pessoais. “Apenas a prisão não é suficiente para desmantelar essas organizações. A descapitalização é uma estratégia de prevenção que mina a estrutura e a capacidade de atuação dessas redes criminosas. É um golpe direto no motor financeiro do crime”, afirmou, ao defender medidas como o sequestro e a alienação antecipada de bens.

Nesse contexto, destacou a importância das Portarias n. 20 e 21/2024 da Secretaria de Estado de Segurança Pública de Mato Grosso, que instituíram a Comissão Permanente de Avaliação e Alienação de Bens, responsável por promover a avaliação, classificação, formação de lotes e leilão de bens móveis e imóveis com determinação judicial de alienação antecipada ou declarados perdidos em favor de fundos públicos.

Outros temas abordados incluíram a possibilidade jurídica da autolavagem, a desnecessidade de participação do autor da lavagem de capitais no crime de antecedente, a dupla justa causa para o recebimento da denúncia (indícios do crime de lavagem e do crime antecedente), o crime de lavagem ser de ação múltipla ou plurinuclear e ser autônomo em relação às infrações penais antecedentes.

Ao final da aula, o juiz destacou os avanços e desafios do sistema de Justiça Criminal, ressaltando que, embora o Brasil tenha assumido compromissos internacionais desde a Convenção de Viena (1988) e avançado na legislação, ainda falta uma cultura institucional voltada à detecção, investigação e repressão à lavagem de dinheiro. “A lavagem é o elemento central do crime organizado, principalmente relacionado ao narcotráfico. A descapitalização dessas organizações é o cerne do combate à criminalidade e ao tráfico”, concluiu.

O desembargador Marcos Machado, responsável pelo ciclo de palestras e membro da Comissão Especial sobre Drogas Ilícitas do TJMT, elogiou a exposição do magistrado. “O senhor está dando uma leitura muito ampla e não tenho dúvida da sua capacidade. A matéria é tão sensível que só sua experiência para dar a repercussão que está imprimindo”, afirmou. O desembargador também destacou a complexidade do cenário atual: “Não temos mais criminosos eventuais. Há planejamento, inteligência e profissionalismo. Precisamos avançar e compreender que não há ingenuidade nem improviso. Todos atuam com propósito.”

A atividade pedagógica, iniciada em 5 de maio, segue até o dia 21 de julho e tem como objetivo proporcionar uma visão aprofundada e multidisciplinar da legislação sobre drogas no Brasil.

A próxima aula será no dia 14 de julho, com o desembargador Wesley Sanchez Lacerda, com o tema ‘Efetividade penal de combate às drogas prevista na Constituição Federal’.

Outras informações podem ser obtidas pelo e-mail esmagis@tjmt.jus.br ou pelos telefones (65) 3617-3844 / 99943-1576.

FIQUE SABENDO EM PRIMEIRA MÃO. TODAS AS NOVIDADES DE NOSSO WEBSITE. CLIQUE ABAIXO E SAIBA MAIS. Facebook - Instagram - Youtube

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

× Anuncie em nosso site